Introdução.

 

A integridade para com a verdade da palavra de Deus é uma questão tão antiga quanto a história da humanidade. Foi lá no Éden que aquela velha serpente, Satanás, o Diabo, ousou a desafiar a Deus com uma grande mentira. A verdade estava sob ataque! Após Adão e Eva terem ouvido o alerta divino de que morreriam naquele mesmo dia se comessem do fruto proibido, Satanás disse a Eva: ‘Vocês não morrerão, mas se tornarão como Deus, sabendo o bem e o mal’. (Gênesis 3:1-5) Não foi à toa que Jesus referiu-se a Satanás como o pai da mentira (João 8:44), pois ao comerem do fruto proibido, Satanás provou ser o primeiro mentiroso. Adão e Eva não se tornaram como Deus do modo como ele havia prometido, naquele mesmo dia eles se tornaram mortos em pecados em delitos, e mais à frente vieram a morrer fisicamente. – Gênesis 5:5.

 

Desde o Éden, Satanás tem feito todos os esforços possíveis para semear mentiras entre o povo de Deus. Se ele usou as Escrituras para tentar desencaminhar Jesus (Mateus 4:1-10), na era da Igreja Cristã ele tem pessoas, que de acordo com o apóstolo Paulo, surgiriam de fora e de dentro da Igreja para ensinar coisas distorcidas e fazer discípulos para si. Paulo chamou isso de “não poupar o rebanho”. (Atos 20:29, 30) Infelizmente, essas palavras têm se cumprido desde os dias de Paulo. E mais especialmente nos dias atuais, a Igreja tem sofrido ataques de hereges de todos os lados.

 

As Heresias Começaram Cedo.

 

Na história da Igreja, logo nos primeiros quatro séculos, muitos hereges surgiram com suas heresias. Eles não quiseram consultar a Igreja. Desenvolveram suas próprias teorias, as quais foram consideradas com o tempo pela Igreja como ensino de demônios. A maioria deles foram excomungados pela igreja. Os mestres da Igreja não mediram esforços para refutar muitos ensinos falsos. Veremos aqui alguns desses hereges e com algumas de suas heresias.

 

1. Simão, o Mago. (? – 65)

 

A Bíblia fala desse Simão em Atos 8:9-24. Observe o perfil dele:

 

(a)         Praticava artes mágicas;

(b)        Procurava a admiração do povo;

(c)         Afirmava ser de grande importância;

(d)        Creu na mensagem apostólica sobre Cristo, junto com vários de seus seguidores, mas quando viu os sinais de como o Espírito Santo era derramado pela imposição de mãos, ofereceu dinheiro aos apóstolos para que ele tivesse o poder de dar o Espírito Santo a outros;

(e)        Foi instado pelos apóstolos Pedro e João que se arrependesse da maldade de adquirir o Espírito Santo em troca de dinheiro.

 

A Bíblia não menciona mais nada sobre ele, mas segundo escritos apócrifos, ele se perverteu na fé cristã. Reunindo vários desses escritos, somos informados que Simão, o Mago:

 

(f)          Fundou uma seita;

(g)        Cria na reencarnação;

(h)        Tinha crenças que pendiam para o gnosticismo que surgiria com mais intensidade no século II, por isso foi considerado o primeiro profeta gnóstico;

(i)          Era tido como um rival de Cristo;

(j)          Dizia-se, segundo Justino Mártir (150 d.C.), ser a manifestação do Deus Supremo;

(k)         Cria que anjos foram gerados pela mente de sua esposa, Helena.

 

Qual foi a origem das crenças heréticas de Simão, o Mago? O seu orgulho, o seu conceito errôneo sobre conversão e sobre a obra do Espírito Santo.

2. Marcião de Sinop (85 – 160 d.C.)

 

Teólogo, Marcião de Sinop foi considerado um dos maiores hereges (ou heresiarcas) dos primeiros séculos da Igreja Cristã, pelos seguintes motivos:

 

(a)         Negava o Deus do Antigo Testamento;

(b)        Aceitava apenas o Deus do Novo Testamento;

(c)         Rejeitava o Antigo Testamento como contrário ao Evangelho de Jesus Cristo.

(d)        Aceitava apenas dez cartas de Paulo e um evangelho resumido de Lucas;

(e)        Para ele, Jesus possuía um corpo aparente, e sua crucificação também foi aparente, como um meio didático de Deus ensinar o povo.

 

Qual a causa desses desvios doutrinários? Marcião não compreendeu a interdependência entre o AT e o NT, e humanizou demais os atos de Deus no AT, considerando-o como um falso deus. Também não creu que o mesmo Espírito Santo que inspirou as Escrituras iluminou os bispos da Igreja da época a reconhecerem os livros inspirados e os distinguirem dos apócrifos.

 

3. Sabélio (? – 222)

 

Sabélio foi um teólogo pseudo cristão excomungado pelo Papa Calixto, no ano 220. As seguintes eram suas heresias:

 

(a)         Negava a doutrina de que Deus subsiste e coexiste em três Pessoas Divinas distintas.

(b)        Apregoava que Deus, em vez de subsistir e coexistir em três Pessoas Divinas distintas, se manifestava em três atividades ou funções (modos) fundamentais: Primeiro, como Pai, depois como Filho, depois como Espírito Santo.

Qual foi a causa de seus desvios doutrinários? Seguiu a lógica humana, pois se Deus é um, como poderia ser três pessoas? Como todo herege, escolheu uma verdade (Deus é um só) e abandonou outra (a pluralidade das Pessoas na Divindade). Para ele, foi mais fácil ensinar um só Deus com funções diferentes, não um só Deus em três Pessoas Divinas.

 

4. Paulo de Samosata. (+/- 200 – 275)

 

Paulo de Samosata (ou Samósata) foi bispo de Antioquia entre os anos de 267 e 270. Mas ele negou a fé Cristã pois:

 

(a)         Defendia o adocionismo, juntamente com Teodoro de Bizâncio, ou seja, ele cria que Jesus tornou-se o Cristo na ocasião de seu batismo e foi adotado pelo Pai depois da sua morte.

(b)        Jesus era filho de Deus enquanto homem, não como o Lógos.

(c)         O Lógos divino era impessoal, ou um poder de Deus em operação.

 

Qual foi a causa de seus desvios doutrinários? Ele foi influenciado por adocionistas anteriores a ele, que negavam a divindade de Jesus. Ou seja, hereges influenciando hereges.

 

5. Ário. (256 – 336)

 

Ário foi um diácono de Alexandria. Nasceu na Líbia, no ano 250 e faleceu em Constantinopla, em 336. Foi conhecido por suas seguintes heresias, ensinadas com um poder enorme de convencimento:

 

(a)         Negou a divindade de Jesus Cristo;

(b)        Influenciado por Paulo de Samosata, o qual cria que Deus teria dado divindade para o humano Jesus, Ário cria que Jesus foi o primeiro ser criado;

(c) Afirmava que Deus Pai é absolutamente único e transcendente;

(d)        Jesus, o Filho, por ter sido criado teve um começo;

(e)  Como criatura, Jesus não poderia ter comunhão de substância com o Pai.

(f)          O Filho, diferentemente do Pai, está sujeito a mudanças e até mesmo ao pecado, podendo cair assim como o diabo caiu.

 

Qual foi a causa de seus desvios doutrinários? Não crer na Igreja e na doutrina dos apóstolos, que considerava Jesus como o Deus de nós (João 20:28), não uma criatura.

 

6. Macedônio (? – depois de 360)

 

Macedônio foi um arcebispo de Constantinopla, no século IV. Embora não negasse a consubstancialidade entre o Pai e o Filho, ensinou as seguintes heresias absurdas:

 

(a)         O Espírito Santo é uma criação do Filho e, por isso, obediente a Ele.

(b)        O Filho era da mesma substância do Pai, mas não era da mesma essência.

 

Qual foi a causa deste desvio doutrinário? Macedônio achou que o fato de o Filho enviar o Espírito Santo da parte do Pai implicava que o Espírito Santo fosse uma criatura. Entendendo mal sobre quem é o Espírito Santo, acabou não sendo iluminado para compreender que o Pai e o Filho possuem a mesma substância e a mesma natureza divinas.

 

7. Apolinário de Laodiceia (310 – 390)

 

Apolinário foi Bispo. Defendia plenamente a divindade de Cristo, lutou contra o arianismo, mas no afã de defender a pessoa divina de Cristo cometeu a seguinte heresia:

 

(a)         Negou que ele possuía uma alma humana, sendo esta substituída pelo Logos.

(b)        Duas naturezas completas não podem tornar-se um ser único.

(c)         Onde há homem, há pecado, assim Jesus não poderia ter alma humana (a sede das vontades).

 

Qual foi a causa desses desvios doutrinários? Levar ao pé da letra o texto “e o Verbo (Logos) se fez carne” (João 1:14), sendo assim o Logos teria ficado, para Apolinário, no lugar da alma humana de Cristo.

 

8. Nestório (386 – 451)

 

Nestório foi arcebispo em Constantinopla. Teólogo e defensor da natureza divina de Cristo, cometeu os seguintes equívocos heréticos condenados no Concílio de Éfeso em 431:

 

(a)         Em Jesus havia duas pessoas, uma humana e outra divina, unidas por um vínculo de afeto ou de moral;

(b)        O Logos habitou na pessoa humana de Cristo, tornando-o portador de Deus, e não um Deus-homem.

 

Qual foi a causa desses desvios doutrinários? Nestório, por ter influência de teólogos de Antioquia, que primavam pela filosofia e a razão, sendo assim, enfatizava mais a humanidade de Cristo e a via como uma pessoa separada de sua pessoa divina.

 

9. Eutiques (378-454)

 

Líder de um mosteiro em Constantinopla, Eutiques tentou refutar a heresia nestoriana, mas cometeu os seguintes desvios doutrinários:

 

(a)         Embora em Cristo houvesse duas naturezas, a divina absorveu a humana;

(b)        Depois da ressurreição, Jesus apenas possuía uma única natureza, daí o nome da heresia: mono (uma) + phisys (natureza).

 

Qual foi a causa desses desvios doutrinários? Eutiques e seus seguidores (Severo, Julião de Halicarnasso, Estéfano Niobes) não confiaram na Igreja para lutar contra o Nestorianismo, mas desenvolveram suas próprias ideias. Para eles, a natureza divina, por ser superior à humana, não poderia conviver com a humana, por isso a absorve.

 

10. Sérgio, de Constantinopla. – Séc. VII

 

Teólogo e patriarca de Constantinopla, Sérgio, no século VII, não negava a natureza humana de Cristo, mas cometeu o seguinte desvio doutrinário:

 

(a)         Cristo não possuía vontade humana. Daí o nome da heresia: Monotelismo – Mono (um) + telismo (vontade, querer).

 

Qual foi a causa desse desvio doutrinário? Não entender corretamente que Jesus tinha vontade humana, e a Bíblia claramente afirma isso nas palavras do próprio Jesus: “Pai, se for possível, afaste de mim este cálice, contudo, ocorra não a MINHA VONTADE, mas a tua.” – Lucas 22:42.

 

O Concílio de Calcedônia (451 d. C) e sua Importância Contra as Heresias Cristológicas.

 

Essas heresias ensinadas por tais hereges, as quais foram condenadas em vários Concílios, negavam ou a humanidade de Cristo ou a sua divindade, o que tornava impossível a redenção. Por isso, o Concílio de Calcedônia, em 451, assim e definitivamente se pronunciou sobre a Pessoa de Cristo:

 

“Portanto, conforme os santos pais, todos nós, de comum acordo, ensinamos os homens a reconhecer um e o mesmo Filho, nosso Senhor Jesus Cristo, totalmente completo na divindade e completo em humanidade, verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem, que consiste também de uma alma racional e um corpo; da mesma substância (homoousios) com o Pai no que concerne à sua divindade e ao mesmo tempo de uma substância conosco, concernente à sua humanidade; semelhante a nós em todos os aspectos, exceto no pecado; concernente à sua divindade, gerado do Pai antes das eras, ainda que também gerado como homem, por nós e por nossa salvação, da virgem Maria; um e o mesmo Cristo, Filho, Senhor, Unigênito, reconhecido em duas naturezas, sem confusão, sem mudança, sem divisão, sem separação; a distinção das naturezas de maneira alguma anula-se pela união; mas, pelo contrário, as características de cada natureza são preservadas e reunidas, para formar uma pessoa e substância [hypostasis], mas não partidas ou separadas em duas pessoas, mas um e o mesmo Filho e Deus Unigênito, o Verbo, Senhor Jesus Cristo; assim como os profetas dos tempos antigos falaram dele e o próprio Senhor Jesus Cristo nos ensinou e o credo dos pais foi transmitido para nós.”

 

Conclusão

 

Até aqui, aprendemos sobre as heresias de pseudo cristãos que não pouparam o rebanho nos primeiros séculos da Igreja. Vimos dez exemplos dentre tantos outros. Mas observamos que embora tais heresias atacassem a Pessoa de Cristo e outras verdades da fé cristã, a Igreja maravilhosamente definiu-se no Concílio de Calcedônia, em 451, sobre a correta interpretação das naturezas de Cristo e de sua divindade plena.

 

Por incrível que pareça, as heresias ensinadas naqueles idos por tantos hereges ainda ecoam em alto e bom som. Em essência, elas são ensinadas por seitas da atualidade. Por isso, é sempre bom estudar a história dos hereges e suas heresias. São velhas garrafas abertas em nossos dias, e muitos delas bebem.